Entrar numa comunidade de software livre sempre é uma escolha influenciada pela proximidade que o contribuinte sente com o ideal detrás da criação do projeto. Muito da automotivação é ocasionada pelos eventos e fatos em que a comunidade está inserida. No entanto, quando a casa começar a tremer nas bases, é porque há chances do teto desabar e às vezes a melhor alternativa é tentar contruir outra.
Há poucas semanas houve um consenso de uma comunidade de desenvolvedores que, por temerem que o seu ideário se modifique, decidiram tomar os rumos do projeto nas proprias mãos. O atual LibreOffice (antigo OpenOffice) e The Document Foundation (entidade responsável pelo projeto) é um caso de que quando a dúvida surge dentro de um projeto, e se existem pessoas que acreditam nos ideais do mesmo, o “divórcio” acaba por entrar em processo de andamento. As ações duvidosas da Oracle após a compra da Sun, como luta de patentes do Java com o Google, o fechamento do Solaris e a enrolação do MySQL, levantou temores da comunidade de desenvolvedores do OpenOffice, ocasionando seu fork.
Recentemente (23/10/2010), Cyrelle Berger iniciou uma thread na lista do koffice-devel anuciando sobre a divisão da comunidade de desenvolvimento do KOffice e como essa é a melhor solução para as discussões que acontecem internamente no projeto. No email, Berger fala que serão feitas perguntas ao KDE e.V. e que isso é uma possibilidade de um novo começo para a suite de escritorio do KDE.
Ao ler os emails da thread até agora, pude ver que o problema é relativo à questões pessoais entre os contribuintes, ao contrário do problema do LibreOffice, que está mais relacionado com a segurança juridica do idéario do projeto. No email, Berger fala de dois grupos de desenvolvedores:um grupo A, composto apenas pelo KWord e um grupo B, com KPresenter, Krita, Karbon e Kexi. Isso de certa maneira acaba por esclarecer algumas duvidas que, como usuários, acabamos por levantar.
O KOffice, mais especificamente o KWord, foi um projeto que tentei utilizar por aproximadamente 2 meses em um momento importante, que foi a escrita do meu trabalho de conclusão de curso. A usabilidade em termos de semiótica, como a escolha dos ícones e posicionamento dos mesmos pelas regras de Gestalt, é muito boa. Mas o KWord tem um problema seriíssimo de desempenho. Quando escrevia cerca de três palavras consecutivas, o programa ainda estava terminando de renderizar a primeira! Sem falar em outros problemas, como modificação indesejada da barra lateral direita, a baixa qualidade de renderização do formato ODF, a discrepância do WYSIWYG do documento gerado entre suites diferentes, e por ai vai. Sei que um software deve ter um foco próprio, mas não apresentar qualidade em certos termos básicos acaba por decepcionar e afastar usuários em potencial.
Infelizmente (ou felizmente, não sei) o KWord foi o único programa que me apresentou esse problema. Outros aplicativos do KOffice, como o Karbon e o KPresenter, não ocorreram esses mesmos incômodos. Quanto ao Krita eu sou suspeito para falar porque sou fã do projeto (um fã crítico, mas ainda assim fã 🙂 e seu desempenho, na maioria das vezes, bate em muitos dos programas que eu utilizo nas minhas brincadeiras artísticas, como por exemplo o Gimp.
Da mesma maneira que muitos apostam na decolagem do The Document Foundation e do LibreOffice com todos os benefícios que isso irá acarretar para a comunidade, espero que essa divisão do KOffice seja benéfica para o KDE como um todo. Não estou ciente de todos os problemas internos do KOffice, mas a abertura para a diversidade de escolhas de projetos tem a possibilidade de trazer a tona mais melhorias para o KDE SC. Então é esperar pra ver.
Espero que a situação do KOffice possa trazer uma provocação para todos nós que tentamos contribuir de alguma maneira aos projetos FOSS: que uma boa comunidade de projetos de software livre se faz com um contato mais próximo com a base de usuários e que luta de egos nas definições de prioridades ajudam muito mais a minarem esforços do que a promover seu sucesso.